Homenagem à tela de Mª Júlia Pacheco
Espelho meu, Há alguém mais bela que eu?
Nem o espelho me responde...
Realmente, olhando bem para mim, quem me quer? quem me assobia? Quem me sussurra um beijo?
E aqui está Maria, abatida, cabelo apanhado à pressa, vestido amarrotado, de alma partida. Curvando-se, vai deixando os seus joelhos tocarem o chão.
Bateu no fundo!
Porquê? Tem casa, tem marido, tem dois lindos filhos gémeos, tem emprego.
Não tem atenção. Não tem amor.
Nos seus ouvidos ecoam as palavras do poeta, na sua poesia "Calçada de Carriche".
Também ela sobe a calçada, triste e cansada. Perdeu a esperança a meio da caminhada.
O espelho continua na sua frente. Nele vai passando a sua vida de menina feliz, de adolescente descontraída, de jovem adulta sonhadora.
As imagens já passaram, O espelho está baço. Ela quer ver. Não consegue.
Uma corrente de ar abre a janela. O ventinho da tarde fá-la estremecer.
Mete as mãos à cabeça. Solta o cabelo.
Que grande que ele está!. Escova-o. E escova-o. E escova-o.
Com o seu jeito de menina vai adornando a sua cabeça com leves caracóis escuros.
Vislumbra-se no espelho.
A imagem está pouco nítida. Gosta de se ver.
Endireita-se. O seu corpo tem tudo no seu lugar. A barriga não diz que gerou duas crianças. Afinal ainda está bonita.
Procura um vestido. O roupeiro tem alguns.
Qual? Este? O vermelho? O branco? Não, o verde- claro.
É a esperança que lhe sorri.
De joelhos, direita, com os braços dentro do vestido, vai sorrindo.
Estou viva!
Estou viva!
No espelho, a imagem nítida brilha como Estrela da tarde, num poente ce Verão.
Bons sonhos!!